Pertencemos a uma geração que quer descobrir o mundo. Queremos fazer ERASMUS, tirar um gap year, fazer uma roadtrip, um interrail, etc. E vivemos num tempo e numa sociedade em que isso é relativamente possível (pelo menos mais possível). Contudo, nos últimos tempos tenho-me questionado sobre esta incessante vontade de viajar e de conhecer outros mundos. Numa altura em que os bens materiais passam para um segundo plano, buscamos fundamentalmente experiências de vida. Mas, não estarão estas “experiências de vida” a tornar-se numa nova forma de consumismo?
Aplicado às viagens, será que viajamos porque gostamos, ou viajamos para dizer que estamos a viajar? Quando estamos a viajar estamos a viver a viagem? Ou estamos a tirar 50 fotos à mesma paisagem, a observá-la pelo telemóvel, quando a temos à nossa frente? Não passaremos demasiado tempo no Instagram a mostrar aos outros o quão fixe está a ser a nossa viagem? E, se não houvesse redes sociais, se só as pessoas mais próximas soubessem que estávamos a viajar, aquela viagem continuaria a ser assim tão fixe?
De facto, toda esta possível forma de consumismo se deve à influência das redes sociais na nossa vida, o que me leva à última questão:
A verdade é que viajar tornou-se uma coisa fixe. A verdade é que achamos mais interessante alguém que viaja, do que alguém que toca piano. A verdade é que ter as bandeiras dos países todos que conhecemos na biografia do Instagram é uma cena fixe. Como se viajar se tornasse numa coleção de “quantos países conheço”, “a quantos sítios já fui”, etc. Como se o valor da viagem estivesse num passaporte todo carimbado, ao invés de estar nos momentos que vivemos durante essa mesma viagem.
E é verdade que isto foi algo que me atormentou quando comecei este projeto. Adiei-o durante algum tempo até realmente criar o blog (o Instagram já existia, com outro nome). O meu maior receio estava em deixar de viver a viagem tal como gosto de o fazer, e passar a estar mais preocupada com a qualidade das fotos que tirava, dos textos que escrevia ou das stories que partilhava. Apercebi-me disso numa viagem que fiz no ano passado em Outubro, no Parque Nacional de Montesinho, em que tirei muitas mais fotografias do que o normal para publicar no “blog que ia fazer”. Muitas das fotografias não me interessavam para nada, mas era importante ter uma imagem da igreja x na aldeia y. E nessa viagem apercebi-me disto e pensei que, “não é por isto que eu viajo e se para ter um blog preciso disto, prefiro não ter”. E por isso adiei este projeto algum tempo.
Aquilo que realmente me faz amar viajar são os momentos que tenho quando o telemóvel está no bolso. É o tomar o pequeno-almoço com aquela vista fantástica, é aquele olhar que nos toca ao passar por algum desconhecido, é sentir a vibração de uma cidade. Quando fiz a última viagem, na Europa Central, já tinha o Instagram lançado e ele estava a crescer de uma forma muito mais rápida do que a que eu estava à espera. Comecei a receber muitas mensagens e a despender quase 2h por dia a responder a toda a gente. E na altura tinha receio de ficar viciada nas redes sociais ao invés de realmente aproveitar o que estava a viver. Tentei ao máximo não o fazer e é por esse motivo que hoje não tenho posts sobre “o que fazer em Praga”, ou “os melhores locais para comer em Budapeste”.
Nessa viagem decidi direcionar este projeto para uma vertente mais pessoal da viagem, sobre como me sentia, como geria o facto de estar sozinha, e por aí fora. E deixar um pouco de lado a ideia de partilhar os locais por onde passei ou os monumentos que visitei. Em primeiro porque precisava de encontrar um equilíbrio que me permitisse usufruir da viagem tal como ela faz sentido para mim, e em segundo porque esta direção do projeto se identifica mais comigo. Mas as redes sociais também têm o seu lado positivo e se não fossem os muitos blogs e Instagrams de viagens que existem na internet, eu nunca teria arriscado em viajar sozinha. E por isso avancei com o projeto tempos mais tarde.
Viajar é uma experiência fantástica, é uma oportunidade de vida única. Mais de metade do mundo não tem possibilidade de viajar e por isso somos um privilegiados. Viajar é, provavelmente, das formas mais enriquecedoras de evoluir e de crescer. Por isso, numa sociedade cada vez mais influenciada pelos media, devemos ter isto em atenção e não deixar que as redes sociais consumam a nossa viagem. O mundo real é o que está cá fora e é esse que vale a pena viver. Não é preciso ter uma fotografia fantástica nas muralhas da China, por entre as 300 que foram para o lixo. Naquele momento o importante é estar presente nas muralhas da China, com a cabeça na China, a viver a China e a crescer com a China. É esse o real valor da viagem!
Girl From Nowhere,
Não diria consumismo, mas uma Democratização da forma como viajamos. Tal como a fotografia, as viagens tornaram-se cada vez mais algo comum na nossa geração. E ainda bem. Na minha opinião, as pessoas não viajam para mostrar (uma minoria, sim!), mas para encontrar novas culturas e experiências.
Continuação de boa viagem!
Muito obrigada pelo seu comentário 🙂
Gostei do texto,e sem dúvida que me identifiquei na hora.Esse é o meu questionamento sempre que viajo,sempre que estou num lugar e pego no telemóvel,vem logo o pensamento Aproveita o lugar e deixa o conteúdo para os outros de lado.
É lado bom e o lado mau das redes sociais…Em breve irei estar na Índia por 6 meses, e espero que seja incrível.O Mundo é nosso
Muito obrigada pelo seu comentário! De facto acho que o equilíbrio, como em tudo na vida, são a chave para o bom senso. Muito boa viagem, a Índia deve ser um país incrível 🙂