Quando fazemos uma pesquisa sobre o que visitar ou o que fazer na Tailândia, a visita à tribo das mulheres girafa é uma das sugestões que nos aparecem. A icónica foto das mulheres com argolas no pescoço chega a ser, até, um dos postais de entrada no país. É fácil para um turista que está a viajar pela Tailândia em 15 dias comprar um tour e visitar esta tribo tão peculiar aos nossos olhos.
No entanto, o mundo não é um lugar a preto e branco. Na verdade, é bem mais cinzento do que aquilo que pensámos quando não arriscamos sair da nossa zona de conforto e ver o mundo. Acredito que a maioria dos viajantes não conheça a história por detrás desta tribo e esse é o propósito que me levou a escrever este texto.
Com este artigo não quero de todo incentivar nem condenar a tua decisão (até porque eu própria não tenho uma opinião sólida sobre o assunto), mas sim informar-te sobre a realidade destas mulheres para que tomes uma decisão mais consciente e ponderada.
Quem são, afinal, as misteriosas mulheres girafa?
Baan Tong Luang é uma das cinco aldeias conhecida como “tribo das mulheres girafa”. Este povo pertence a uma minoria étnica tibeto-birmanês que se refugiou no nordeste da Tailândia na década de 80, após inúmeros conflitos étnicos no Myanmar. São originários do povo karen e, dentro deste, fazem parte da minoria kayan.
O governo tailandês permitiu que os kayan permanecessem no seu território, segundo o estatuto de refugiados. Para tal, atribuiu-lhes zonas específicas onde estes têm permissão para viver, na província de de Mae Hong Son.
Estas zonas são relativamente próximas de Chiang Mai, uma cidade muito procurada pelo turismo, no norte da Tailândia. Devido à proximidade existem vários tours de 1 dia onde, por entre outras atividades, os turistas têm a possibilidade de conhecer estas tribos.
Porque é que as mulheres girafas usam argolas no pescoço?
A identidade cultural da tribo karen está nas pesadas argolas que somam no seu pescoço. Estes anéis de bronze são usados pelas mulheres a partir dos 5 anos de idade. Por cada ano, adicionam uma argola, até chegarem aos 40 anos.
Curiosamente, estes anéis não fazem “crescer” o pescoço das mulheres girafas. Na verdade, são os ombros que descaem, dando a impressão de que o pescoço cresceu. É pura ilusão ótica. As argolas são extremamente pesadas e o seu peso pode chegar aos 10 kg. Ao contrário do que se pensa, as mulheres girafas podem tirar as argolas ao longo da vida, seja para trabalhar no campo, para tomar banho ou outras atividades.
A origem desta tradição está envolta num mistério. Uns dizem que é para se proteger dos ataques de tigres, outros dizem que servia para as impedir de se tornarem escravas ou ainda para se tornarem mais parecidas com um dragão, símbolo de força. Nos dias de hoje são um símbolo de beleza para as mulheres da tribo karen. Quanto mais alto for o pescoço, mais bela é a mulher.
Com o aumento do turismo na região, esta é uma tradição que promete perdurar. Na verdade, as argolas das mulheres girafas são uma característica distinta, que atrai centenas de turismo às suas aldeias. E o povo karen soube aproveitar este interesse da melhor maneira. As mulheres girafa ocupam-se essencialmente do artesanato, que vendem aos turistas que as visitam.
Desta forma, conseguem viver de forma quase autossuficiente, apesar de manterem o estatuto de refugiados.
A dura realidade por detrás da tribo das mulheres girafas
Atualmente estima-se que a Tailândia abrigue cerca de 90 mil refugiados, sendo que a sua maioria pertence à minoria étnica do povo karen. Destes, cerca de 600 pessoas pertencem ao povo kayan, o subgrupo que ficou conhecido como a tribo das mulheres girafas. Este povo divide-se em três aldeias que estão abertas aos turistas e um campo de refugiados, que não é possível visitar.
Para compreender o problema é preciso entender que a Tailândia não segue os protocolos da Organização das Nações Unidas (ONU) para os refugiados. Na prática, embora a Tailândia permita que estes habitem no seu território, o país não lhes reconhece o estatuto de cidadãos. Isto significa que o povo karen não tem possibilidade de trabalhar, pelo menos de forma legal, de comprar um terreno, abrir um negócio, estudar numa escola pública, ir ao hospital e por aí fora. Além disso, são olhados com preconceito pelo próprio povo tailandês, sendo muitas vezes considerados como “pessoas de segunda”.
Ou seja, acabam por ficar extremamente limitados. Vivem nas suas aldeias e têm de sobreviver com o mínimo de recursos disponível.
Segundo Duncan McArthur, diretor da TBC,
“Estima-se que existam cerca de 3 milhões de migrantes do Myanmar na Tailândia. Destes, apenas metade tem permissão de trabalho legal. Mesmo os trabalhadores registados estão bastante limitados já que não podem sair da sua respetiva província sem uma autorização. Os trabalhadores sem autorização que vivam fora das áreas concedidas são considerados imigrantes ilegais e sujeitos a deportação”.
É ético visitar a tribo das mulheres girafa?
Esta é talvez a pergunta mais difícil que se possa fazer, já que estamos perante um grave problema de Direitos Humanos. A resposta é um verdadeiro pau de dois bicos.
Ativistas dos Direitos Humanos defendem que este povo vive numa verdadeira prisão a céu aberto e que, visitá-las por motivos de turismo, é como que visitar um jardim zoológico humano. Além disso, ao fazê-lo, estaremos a alimentar os bolsos do estado já que uma parte do que o que os turistas pagam pelos tours reverte para o governo tailandês e para agências de turismo que não se preocupam minimamente com esta condição deplorável. Afirmam que a tribo das mulheres girafa é o retrato de uma exploração abusiva e de um total desrespeito pelos Direitos Humanos.
No entanto, apesar de todas as questões humanitárias, este povo quer e precisa de receber turistas para sobreviver. A verdade é que a qualidade de vida da tribo das mulheres girafa melhorou significativamente com o turismo.
“Sem turistas seria muito difícil para nós viver aqui. Nós gostamos de receber viajantes e de lhes mostrar como é viver numa aldeia kayan tradicional. Quantas mais pessoas vierem, mais nos ajudarão a preservar as nossas tradições”, explica uma das habitantes desta tribo no documentário Beyon the Rings.
O povo soube aproveitar a curiosidade dos turistas da melhor forma, uma vez que a sua principal fonte de rendimento está no dinheiro que fazem com a venda de artesanato feito por eles. Sem isto, não haveria qualquer entrada de dinheiro líquido e estes viveriam apenas do que conseguissem cultivar nas pequenas áreas onde têm permissão para viver. Além disso, se não fossem uma “atração turística” possivelmente a Tailândia já os teria deportado para o Myanmar, tal como tem feito com inúmeros outros grupos étnicos que não privilegiam da mesma condição.
Acredito que não exista uma resposta imediata para esta questão. Os limites daquilo que é certo e errado facilmente se esbatem para lá das fronteiras ocidentais e é imperativo olhar para os diferentes ângulos do problema. Certos de que, na maioria das vezes, não encontraremos uma resposta certa e teremos de aceitar a “resposta menos má” que, em consciência, conseguiremos tomar.
É possível visitar a tribo das mulheres girafa de forma responsável?
Não sei se existe uma forma totalmente ética e responsável para visitar a tribo kayan. Existem sim diversas formas e umas serão, certamente, mais “corretas” do que outras.
Uma delas passa por visitar a tribo das mulheres girafa por conta própria. A aldeia de Huay Pu Keng fica a cerca de 30 minutos de Chiang Mai e é possível chegar lá de scooter ou táxi. À entrada é necessário pagar 300 THB, valor que reverte por inteiro para a comunidade.
Outra opção mais responsável é recorrer a agências de turismo que efetivamente se preocupam com a condição em que este povo vive. Uma delas, se não mesmo a única, é a Thailand Hilltribe Holidays, uma agência sediada em Chiang Mai cujos guias turísticos são nativos destas tribos. É uma forma de “dar trabalho” a estas pessoas e, assim, ter um impacto menos negativo. Além disso, é sempre vantajoso ter um guia nativo, que compreende melhor o contexto em que estas pessoas vivem e que, portanto, poderá transmitir uma perspetiva mais real da sua situação delicada. E, por último, poderão sempre comprar artesanato e apoiar ainda mais esta comunidade.
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Amei esse post. Eu vou fazer uma viagem a Tailândia em um futuro próximo e como qualquer outra turista sempre ficamos na dúvida do que fazermos de forma mais responsável possível! E existem anos de bombardeio de informações turísticas e sabemos que é um povo asiático com culinária, fé, cultura e costumes bem diferentes. O templo dos tigres eu não irei visitar, o santuário dos elefantes também. Mas minha dúvida continuava a ser a tribo das mulheres girafa e seu post me ajudou a pensar com mais clareza do que seria pra elas o mais importante e coerente. Obrigada.